No primeiro trimestre de 2020, período inicial da crise sanitária, as regiões metropolitanas somavam 20,2 milhões de pessoas em domicílios com renda per capita do trabalho inferior a um quarto do salário mínimo. No mesmo intervalo de 2021, o número subiu para 24,5 milhões. O aumento de 4,3 milhões vem dessa comparação.
O boletim chegou ao resultado com base em informações da pesquisa Pnad Contínua, do IBGE. Entre o primeiro trimestre de 2020 e igual intervalo de 2021, o percentual de pessoas vivendo em domicílios com renda menor do que um quarto do salário mínimo pulou de 24,5% para 29,4% nas metrópoles.
O estudo é produzido em parceria entre PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), Observatório das Metrópoles e Observatório da Dívida Social na América Latina. Os números consideram apenas a renda do trabalho. Ou seja, recursos de benefícios sociais, como aposentadoria ou Bolsa Família, não entram no cálculo. O auxílio emergencial também não e, nos períodos analisados, o benefício não estava sendo pago.
Em 2021, um quarto do salário mínimo equivale a R$ 275. No ano anterior, a R$ 261,25. A renda per capita domiciliar corresponde ao rendimento total do trabalho dividido pela quantidade de pessoas em cada residência. “É um nível de renda muito baixo, que reflete a dinâmica do mercado de trabalho na pandemia. Os dados mostram a necessidade de benefícios como o auxílio emergencial”, diz André Salata, professor do programa de pós-graduação em ciências sociais da PUCRS e um dos coordenadores do boletim.
Segundo o estudo, a parcela dos 40% mais pobres sofreu a maior perda de renda nas metrópoles. No intervalo de um ano, entre o primeiro trimestre de 2020 e igual período de 2021, o rendimento dessa camada despencou 33,4% nas regiões metropolitanas.
No primeiro trimestre de 2020, a renda média do trabalho dos 40% mais pobres era estimada em R$ 233,94. Ao encolher 33,4%, atingiu R$ 155,89 no começo de 2021.
Enquanto isso, os 10% mais ricos tiveram queda bem menor, de 4,8%. A renda média do grupo recuou de R$ 6.921,41 para R$ 6.590,05 no mesmo intervalo. Já os 50% que compõem a faixa intermediária registraram baixa de 7,6% (de R$ 1.313,12 para R$ 1.213,55).
No geral, considerando toda a população, houve queda de 8,5% no rendimento nas regiões metropolitanas. O indicador médio passou de R$ 1.423,93 para R$ 1.302,79. A redução fez a renda do trabalho voltar a nível semelhante ao do início da série, em 2012.
Salata define o cenário como “bastante complicado”. Além da queda na renda do trabalho, analisada pela pesquisa, houve interrupção nos pagamentos do auxílio emergencial no começo do ano. Segundo o pesquisador, a camada mais desfavorecida exerce atividades nas quais é mais difícil atuar de maneira remota, o que também impacta o rendimento do grupo.
O estudo também confirma uma tendência já verificada por outras pesquisas: o aumento da desigualdade. Essa diferença entre a renda de ricos e pobres é medida pelo coeficiente de Gini. Na escala do indicador, zero significa igualdade nos ganhos. Quanto mais próximo de 1, maior é a desigualdade.
Na média móvel, o coeficiente subiu de 0,608 para 0,637 entre o primeiro trimestre de 2020 e igual período de 2021. A nova marca é a maior da série histórica, segundo o boletim. O aumento de 4,8% entre os trimestres também é recorde, acrescenta o estudo.
“Tivemos dois elementos trabalhando juntos: a queda na renda média e a piora na distribuição”, diz Salata. Conforme o levantamento, os 10% mais ricos ganhavam, em média, 29,6 vezes mais que os 40% mais pobres no primeiro trimestre de 2020. A diferença subiu para 42,3 vezes no início de 2021. (Folha Press)