Seis empregadores cearenses na "lista suja" do trabalho escravo; um fica em bairro de luxo

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A nova “lista suja” do trabalho escravo traz 48 novos empregadores. 


Seis empregadores cearenses estão no novo cadastro nacional do trabalho escravo. São listadas 187 empresas do Brasil que tenham submetido trabalhadores a condições análogas às de escravo. O documento atualizado foi publicado nesta quarta-feira, 3, pela Secretaria do Trabalho do Ministério da Economia.


O cadastro expõe casos em que houve resgate de pessoas em condições análogas à escravidão. As 48 empresas que entraram na atual “lista suja” foram fiscalizadas entre 2014 e 2018. Antes de entrar no cadastro, empregadores têm direito de se defenderem em duas instâncias. Todas as empresas mencionadas nesta matéria tiveram defesa indeferida ou perderam prazo para recorrer.


No Ceará, dois empregadores da “lista suja” têm sede na localidade de Sítios Novos, zona rural de Caucaia (Região Metropolitana de Fortaleza). São sete trabalhadores envolvidos com um empregador (que está na lista desde, pelo menos, 2016) e seis com outro. Ambos têm atividade econômica classificada como ”Extração de madeira em florestas nativas”. O POVO Online não conseguiu localizar os empregadores.


Em Jericoacoara, um empregador tem CNPJ registrado como “estacionamento central” mas tem atividade econômica classificada como “construção de edifícios”. Dois trabalhadores estavam em condições análogas à escravidão quando da inclusão na lista. A reportagem não teve as ligações atendidas pela empresa.


O quarto empregador da lista é uma empresa de aluguel de máquinas e equipamentos com endereço no Meireles, bairro nobre de Fortaleza. No local, porém, não há ponto comercial. Portanto, não foi possível localizar a firma.


Em seguida, um único empregador em fazendas de Cruz e Acaraú (Litoral Oeste do Ceará) responde por três trabalhadores envolvidos em condições análogas à escravidão. Não foram encontrados contatos das fazendas.


Por fim, está uma confecção de roupas no bairro Jereissati I, em Maracanaú (Região Metropolitana de Fortaleza), com dois trabalhadores envolvidos em situação análoga à escravidão.


Brasil


A nova “lista suja” do trabalho escravo traz 48 novos empregadores. São conhecidas nacionalmente marcas como a grife de moda Animale, que subcontratou costureiros imigrantes bolivianos; e o produtor da Fazenda Cedro II, que comercializa o Café Fazenda Cedro. A marca ostenta selos de boas práticas de certificadoras internacionais, como Rainforest Alliance, Starbucks e Nespresso.


Conforme informações da ONG Repórter Brasil, a Nespresso e a Rainforest Alliance suspenderão a certificação. A Starbucks vai investigar e disse que pode suspendê-la. Os auditores-fiscais do trabalho constataram na fazenda, após fiscalização ocorrida em julho de 2018, seis trabalhadores com jornadas exaustivas que iam, em alguns casos, de 6 às 23 horas, além de condições de higiene consideradas degradantes nos alojamentos. Muitas vezes, eles não tinham folga semanal.


“Isso (trabalho escravo) é improcedente. Estou tomando as minhas providências. Entrei com mandado de segurança e não paguei um centavo de multa”, afirmou Helvécio Batista, em nome da marca Cedro, à Repórter Brasil.


“É tudo inverdade. Esses caras do ministério fazem terrorismo para cima da gente que está fazendo riqueza para esse País”, completou Batista. “Minha fazenda é certificada. Tenho Nespresso, Starbucks, Rainforest, UTZ. Todas em dia”. Segundo o produtor de café, sua fazenda foi auditada na semana passada pela Nespresso. Após a publicação da reportagem da Repórter Brasil, a Nespresso, marca controlada pela Nestlé, afirmou que vai suspender a compra do café da fazenda Cedro II.


Grife de luxo


Os imigrantes bolivianos subcontratados pela Animale recebiam, em média, R$ 5 para costurar peças de roupa vendidas por cerca de R$ 700 nas lojas. A fiscalização do extinto Ministério do Trabalho flagrou, em setembro de 2017, o crime em três oficinas na Região Metropolitana de São Paulo.


Em uma delas, os imigrantes costuravam das 7 às 21 horas, com apenas uma hora de descanso. Um dos trabalhadores recebia R$ 6 para costurar uma calça que demorava uma manhã inteira para ficar pronta. Os fiscais também constataram que as máquinas de costura ficavam próximas das camas dos trabalhadores, o que estimulava ainda mais as longas jornadas.


A Animale informou que “não compactua com a utilização de mão de obra irregular em suas cadeias de produção” e que o ocorrido foi “um caso isolado”. Em nota, afirmou ainda que um fornecedor da marca sub-contratou, sem consentimento da empresa, serviços de costura onde foram constatadas as irregularidades, descumprindo inclusive o contrato de prestação de serviços. A Animale disse também que, após a autuação, tomou as medidas necessárias para tornar mais rigorosa a fiscalização de sua cadeia produtiva.


A Animale é uma das 38 marcas da moda envolvidas com trabalho escravo no Brasil. O histórico de cada uma e os detalhes de como atuam para monitorar o cumprimento da lei trabalhista entre seus fornecedores podem ser conferidos no aplicativo Moda Livre desenvolvido pela Repórter Brasil, conforme O POVO Online noticiou. O aplicativo está disponível no Google Play e na Apple Store e avalia desde 2013 as ações adotadas para combater o trabalho escravo entre seus fornecedores.


Saiba Mais


Quatro elementos podem definir escravidão contemporânea, de acordo com o artigo 149 do Código Penal: trabalho forçado (que envolve cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde, a segurança e a vida) ou jornada exaustiva (levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde, segurança e vida).


LUCAS BRAGA