O plenário da Câmara dos Deputados aprovou ontem, por 379 votos a 131, o texto-base da reforma da Previdência — eram necessários 308. A vitória folgada da proposta, apresentada pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL) ainda em fevereiro, foi capitaneada pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
A medida, que contou com apoio de metade da bancada cearense, segue em análise na Câmara. A Casa vota hoje cerca de 20 destaques à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) antes de submetê-la à apreciação em segundo turno. Só depois de aprovada em nova rodada é que a medida é encaminhada ao Senado, onde precisa obter 49 votos (de 81) para ter sucesso.
A versão do texto aprovada ontem prevê cerca de R$ 900 bilhões de economia em uma década, patamar abaixo do estabelecido como meta pelo ministro Paulo Guedes (Economia), que era de R$ 1,2 trilhão em dez anos.
Antes mesmo da divulgação do resultado da votação, Maia fez discurso repleto de simbologia e de mensagens, algumas enviadas ao Executivo. Emocionado, disse que o papel da Câmara “é recuperar a força do Congresso Nacional, porque estamos fortalecendo a nossa democracia”.
O demista afirmou ainda que “não haverá investimento privado se nós não tivermos uma democracia forte” e que o “investidor de longo prazo não investe em país que ataca as instituições”. E, dirigindo-se ao líder do governo, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), declarou: “Nós vamos precisar construir, daqui para a frente, uma relação diferente, em que o diálogo e o respeito prevaleçam em relação a qualquer tipo de ataque”.
Pelas redes sociais, Bolsonaro festejou a aprovação da PEC, que é ponto crucial da agenda econômica do Planalto. No Twitter, o pesselista escreveu: “Cumprimento a Câmara dos Deputados, na pessoa do seu presidente Rodrigo Maia, pela aprovação, em 1° turno (379×131), da PEC da Nova Previdência”. Em seguida, disse que o “Brasil está cada vez mais próximo de entrar no caminho do emprego e da prosperidade”.
Ainda que o Governo tenha sido determinante no resultado ao liberar recursos de emendas parlamentares nas vésperas da votação (mais de R$ 1 bilhão apenas nos primeiros dias de julho), deputados avaliam que o êxito da reforma só foi possível por causa de Maia.
“Foi uma vitória do presidente da Câmara e não do Bolsonaro. O nome dele sequer foi lembrado”, avaliou o petista José Guimarães. Para ele, que foi um dos 11 cearenses contra a medida, a aprovação da reforma com larga margem de votos consolida um novo bloco político-ideológico, “com o centrão dirigido pelo Rodrigo Maia”.
O parlamentar, no entanto, ressalva que ainda faltam destaques importantes que podem modificar o texto final. “Não é uma vitória definitiva. Fizeram uma meia-sola, porque o ponto central era a capitalização”, defende. Segundo Guimarães, os principais destaques tratam da regra de pensão, professores, policiais e pedágio para aposentadoria.
Também contrário à PEC, o deputado federal Capitão Wagner (Pros) afirma que “não há dúvida de que a atuação do Maia foi essencial para esse resultado” e que o colega de Parlamento “foi o principal articulador da reforma”. De acordo com ele, o governo Bolsonaro “entrou como coadjuvante”.
Cientista político da Faculdade Mackenzie, Rodrigo Prando concorda com os deputados. “É uma reforma que foi abraçada pelo Legislativo porque o Bolsonaro sempre foi estatizante e corporativista”, analisa. “Na incapacidade de articulação do presidente”, prossegue o especialista, “Maia sai como principal ator do processo”. Prando acrescenta: “O poder não fica órfão. O resultado é uma resposta que o Maia dá”.