MEC libera que livros didáticos usem dado sem fonte e ignorem diversidade

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Novas diretrizes para livros destinados aos alunos das últimas séries do ensino fundamental foram publicadas no dia 02 e valem a partir de 2020


Por Clara Cerioni


 


São Paulo — O Ministério da Educação do governo de Jair Bolsonaro alterou as diretrizes do edital que orienta a produção dos livros escolares para os anos finais do ensino fundamental: 6º ao 9º ano, ou alunos na faixa entre 10 e 15 anos.


Publicado no dia 2 de janeiro, no site do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, o novo texto reformula alguns trechos do anterior, que foi aprovado no começo de 2018.


Há mais de doze alterações, identificadas pela reportagem, que determinam novos critérios para os livros que devem chegar às unidades de todo país em 2020.


Dentre as mudanças técnicas, foi retirado o item que impedia erros de revisão e impressão e também não é mais obrigatório que os materiais tenham referências bibliográficas, abrindo caminho para divulgação de informações sem fonte claramente indicada.


Também foi retirado um item que proibia propaganda, mencionando que os livros não podiam ter “publicidade, de marcas, produtos ou serviços comerciais”.


Isso impedia o uso mesmo de ilustrações para análise de texto, como uma propaganda antiga que ilustrasse uma característica histórica de uma sociedade, por exemplo.


De forma geral, houve uma mudança na própria estrutura do texto. Enquanto antes haviam vetos explícitos, agora há uma orientação geral que ignora aspectos mencionados anteriormente.


Em relação às questões sociais, não há mais proibição em relação a conteúdo que promova negativamente a imagem dos povos do campo.


Outro trecho excluído era aquele proibindo obras que desconsiderassem “o debate acerca dos compromissos contemporâneos de superação de toda forma de violência, com especial atenção para o compromisso educacional com a agenda da não-violência contra a mulher”


 


Também foi retirada uma exigência de que as ilustrações deveriam “retratar adequadamente a diversidade étnica da população brasileira, a pluralidade social e cultural do país”.


Outro trecho suprimido destacava a necessidade de que as obras tratassem de saúde, sexualidade, vida familiar e social, educação para o consumo, educação financeira e fiscal, trabalho, ciência e tecnologia e diversidade cultural.


Histórico


As mudanças do edital consolidam o posicionamento do novo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues, que teve como primeiro ato desmontar uma secretaria responsável por ações de diversidade, como direitos humanos e relações étnico-raciais.


O ministro declarou diversas vezes que combaterá a “ideologia de gênero nas escolas” e o “marxismo cultural” e não permitirá que “pautas nocivas” aos costumes sejam “impostas” ao país.


 “Combateremos o marxismo cultural, hoje presente em instituições de educação básica e superior. Trata-se de uma ideologia materialista alheia aos nossos mais caros valores de patriotismo e de visão religiosa do mundo”, afirmou Rodríguez em sua cerimônia de posse, em 2 de janeiro.


O presidente eleito, Jair Bolsonaro, já deu declarações contrárias à forma com que a educação é tratada no Brasil. Para ele, “quem ensina sexo é papai e mamãe”. Esse, inclusive, é um tema que “não precisamos discutir”. Em sua avaliação, a maioria dos brasileiros “quer isso”.


Uma pesquisa do Datafolha, divulgada nesta semana, mostra que 54% dos brasileiros apoia a educação sexual nas escolas. As mulheres concordam mais do que os homens (56% e 52%, respectivamente), mas fica empatado na margem de erro.


A reportagem entrou em contato com o Ministério da Educação questionando a justificativa para as mudanças, quem as orientou e se há alguma avaliação de risco de que informações erradas sejam transmitidas aos alunos. A matéria será atualizada assim que o posicionamento for recebido.