| Articulação | Mesmo com aliados no comando das duas casas legislativas, governo de Jair Bolsonaro (PSL) pode ter dificuldades na articulação, avalia especialista
Após a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado no último fim de semana, começa o grande teste para a articulação política do governo de Jair Bolsonaro (PSL). Até 10 de fevereiro, o Planalto deve enviar o projeto de reforma da Previdência, medida em torno da qual oposição e situação travam a sua primeira queda de braço.
Deputado federal e presidente do PSL no Ceará, Heitor Freire projeta que a eleição de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, ambos do DEM, para presidir Câmara e Senado, respectivamente, facilita o trâmite da agenda econômica do Governo.
”O DEM é um partido comprometido com as pautas do Bolsonaro”, avaliou Freire. “Ambos os presidentes têm uma conversa livre com o ministro (Paulo Guedes, da Economia) e estão apoiando o conjunto das reformas.”
Para o deputado, a pauta que norteou a eleição de Maia para o comando da Câmara “é liberal e se encaixa com a do Guedes”.
No Senado, o parlamentar assegura que o Governo terá caminho livre para avançar. “O Davi foi ungido pelo Onix (Lorenzoni, da Casa Civil). Pra agenda de Bolsonaro, isso é fantástico”, disse. Além da Previdência, o Governo deve tentar votar ainda neste ano as reformas fiscal e tributária.
Freire acrescenta ainda que, no processo de formação de blocos na Casa, o PT se enfraqueceu. “Afastamos o PT da mesa, o partido não vai presidir nem a minoria”, afirmou.
Para o deputado federal José Guimarães (PT), todavia, a legenda tem musculatura para ajudar a barrar a agenda bolsonarista no Congresso.
Segundo o petista, a sigla dá início ainda nesta semana a uma série de articulações com objetivos de reunificar a oposição e organizar resistência
à Previdência.
“Nossa tarefa primordial é recompor o bloco de oposição. Já temos PSB e Psol”, calculou. “Vamos tentar atrair o restante das legendas. E vamos atrás de cada parlamentar que está na contramão do que
quer o Guedes.”
O passo seguinte, informa Guimarães, é “apresentar uma contraproposta de reforma que preserve direitos, taxe os grandes devedores e cobre a bilionária dívida” da Previdência. “Querer fazer reforma só pra taxar os coitados”, ele conclui, “é atender os interesses do mercado”.
Sociólogo e membro do Conselho de Leitores do O POVO, Cleyton Monte afirma que, embora os presidentes das duas casas legislativas sejam aliados de Bolsonaro, “os planos do Governo talvez não saiam como ele desenhou”.
Monte avalia que, na Câmara, “Maia tem força própria e pode impor o ritmo dele nas votações, inclusive mudando os termos dessas reformas, como a da Previdência”. Conforme o analista, o político do DEM elegeu-se novamente para a chefia da mesa diretora mais por méritos próprios do que do Governo.
“O PSL viu que não podia bater de frente com o Rodrigo Maia, e o Planalto se curvou aos fatos”, complementa.
Questionado sobre o papel de Davi Alcolumbre nessa relação com o Governo, Monte acredita que a inexperiência do senador na condução dos trabalhos da Casa pode ser um obstáculo para Bolsonaro.
“O presidente eleito no Senado é totalmente inexperiente em articulação. E, pra forçar medidas impopulares, como ajuda para os estados ou Previdência, tem que ser um político com poder de articulação grande”, respondeu.
De acordo com o pesquisador, diferentemente do que houve com Maia, a votação de Alcolumbre foi fragmentada, com votos de bolsonaristas, com Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), e de nomes da oposição, como Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
“O Alcolumbre ganhou porque teve apoio do PSDB e da Rede. Mas ele, em si, não articulou a própria vitória. Além disso, esse grupo anti-Renan não é necessariamente Alcolumbre”, pondera.