Revisão de benefícios tributários estima redução de R$ 50 bi

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Cortes sugeridos pela Receita atingem Simples Nacional, MEI, setor agrícola e pessoa física

 

O plano de revisão de benefícios tributários do governo estima para este ano uma redução de quase R$ 50 bilhões em renúncias de receita. Para 2021, a expectativa era de um corte ainda maior, da R$ 56 bilhões. O estudo, mantido em sigilo, foi remetido ao Congresso Nacional em dezembro do ano passado, antes, portanto, dos efeitos econômicos causados pela pandemia.

O documento, ao qual o Valor teve acesso, detalha as dezenas de setores, programas e regimes especiais afetados pelo plano, que prevê a extinção, a redução ou a delimitação temporal de uma série de benefícios. Também recomenda que novos projetos – mesmo que negociados em troca de investimentos – não sejam mais aceitos pelo governo.

De acordo com a Receita, o plano tem o objetivo de limitar os benefícios tributários ao valor correspondente a 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em um prazo de dez anos. O gasto tributário, como é definido tecnicamente o conjunto de benefícios, era estimado em quase R$ 307 bilhões no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2019, usado como referência no plano. O patamar equivale a 4,2% do PIB, considerando que o indicador fechou o ano passado em cerca de R$ 7,3 trilhões – ou seja, mais do que o dobro da meta perseguida pelo governo.

Questionada se os desdobramentos da pandemia teriam ocasionado mudanças no plano de revisão das renúncias, a Receita informou, por meio de sua assessoria, que não iria comentar.

Uma das principais mudanças propostas no estudo afeta o Simples Nacional, regime especial que enquadra micro e pequenas empresas. O Simples responde pela maior fatia dos gastos tributários totais, com pouco mais de R$ 87,2 bilhões em 2019.

Pelas estimativas do governo, a renúncia tributária do programa seria reduzida em R$ 19,5 bilhões neste ano e R$ 22,5 bilhões em 2021, por meio da redução do limite máximo de faturamento admitido no Simples, que passaria dos atuais R$ 4,8 milhões para R$ 3,6 milhões por ano.

A queda nas renúncias também considera mudanças na faixa de empresas que faturam entre R$ 3,6 milhões e R$ 4,8 milhões, que é o chamado “sublimite” do Simples. Empresas nessa situação podem ter que pagar ICMS e ISS sobre os valores constantes nesse intervalo. Pela proposta do governo, essa regra começaria a valer já para quem fatura acima de R$ 1,8 milhão.

O estudo também prevê alterações no enquadramento de advogados e contadores, que passariam a integrar o Anexo 5 do Simples, onde estão as empresas que prestam serviços de auditoria, publicidade e engenharia, por exemplo. Segundo a Receita Federal, advogados e contadores têm “tratamento diferenciado” em relação a outras atividades consideradas intelectuais.

Outra recomendação que teria efeitos sobre o empreendedorismo é a de aumentar a alíquota incidente sobre o programa de Microempreendedor Individual (MEI). Pela proposta, esses trabalhadores passariam a pagar contribuição previdenciária correspondente a 11% do valor do salário mínimo. Hoje, a taxa é de 5%.

Para todas as propostas previstas no plano, o governo definiu uma escala de sensibilidade política que vai de 1 a 5. No caso do Simples, o indicador foi classificado no nível máximo, possivelmente considerando o fato de que a mudança afetaria quase 3,4 milhões de contribuintes.

Segunda maior fonte de gastos tributários, com pouco mais de R$ 32 bilhões estimados, os rendimentos isentos do Imposto de Renda também estão na mira do fisco. A ideia central é estabelecer um limite de valor para as isenções oferecidas a pessoas que se aposentaram por moléstia profissional ou doença grave.

O governo também quer exigir que essas pessoas sejam obrigadas a comprovar, mediante laudo médico, que são portadoras das doenças. Beneficiados por esse dispositivo, os cegos só seriam admitidos se comprovassem que a deficiência acomete os dois olhos. O efeito da atualização foi estimado pela Receita em uma redução de R$ 2,47 bilhões neste ano e R$ 2,85 bilhões em 2021.

No caso dos rendimentos que já são tributados, o governo considera limitar a R$ 25 mil por ano a dedução de despesas médicas no Imposto de Renda da Pessoa Física. O teto valeria individualmente para cada dependente.

Para o setor agrícola, que recebe benefícios tributários da ordem de R$ 30 bilhões anuais, o plano prevê pelo menos três mudanças. Uma trata do aumento, de 1,2% para 2%, do percentual de contribuição previdenciária destinada ao Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural).

O plano também reduz em 50% os benefícios concedidos ao setor agropecuário na forma de créditos presumidos do PIS/Cofins relacionados à aquisição de alguns insumos. A proposta visa ainda revogar a isenção da mesma contribuição para a venda ou importação de alguns produtos que hoje estão na cesta básica.

O argumento é de que alguns desses produtos não compõem a cesta básica, mas foram incluídos pela Lei 12.839/2013, no governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Entre esses itens estão tipos de carnes, além de café, manteiga, margarina e produtos de higiene pessoal. Os efeitos dessas medidas em termos de redução de renúncia tributária foram estimados em R$ 5 bilhões.

Outra área beneficiada, a Zona Franca de Manaus também poderá perder parte dos incentivos. O plano elaborado pela Receita sugere que revogação dos dispositivos que concedem alíquotas diferenciadas do PIS/Cofins incidente sobre as vendas das empresas estabelecidas na região para o restante do país. A medida poderia resultar, em 2020, em uma redução de pouco mais de R$ 1,1 bilhão nas renúncias fiscais.

Tema da mais recente queda de braço entre o governo e o Congresso, a desoneração da folha de pagamento também consta na proposta elaborada pela Receita. A sugestão é que uma contribuição patronal incidente sobre a receita bruta – com alíquota entre 1% e 4,5% – substitua a contribuição previdenciária sobre os salários, que seria revogada para todos os setores da economia.

Na semana passada, empresários beneficiados pela desoneração temporária da folha, por conta da pandemia, pressionaram o Congresso para que seja derrubado o veto do presidente Jair Bolsonaro à prorrogação do benefício. Uma definição, provavelmente por meio de um acordo entre governo e parlamentares, deve ser conhecida nos próximos dias.

Fonte: Valor Econômico

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