Dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), produzida pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que no trimestre de maio a julho de 2019, antes da crise sanitária, a renda média do trabalho era estimada em R$ 4.468 para os empregados do setor público.
Três anos depois, em igual trimestre de 2022, o rendimento baixou para R$ 4.086, o equivalente a uma queda de 8,5% na pandemia. Os dados levam em conta a inflação. Em igual período de comparação, a renda média dos empregados do setor privado, exceto os trabalhadores domésticos, recuou de R$ 2.421 para R$ 2.350. A baixa foi de 2,9%.
Os empregados domésticos, por sua vez, tiveram contração de 5,1%. A média encolheu de R$ 1.106 para R$ 1.050. Os dados do IBGE consideram apenas os recursos obtidos com o trabalho por quem segue ocupado em vagas formais ou informais. Fontes como benefícios sociais não entram nos cálculos.
A inflação elevada fez a renda dos brasileiros encolher de maneira generalizada na pandemia. No caso dos empregados no setor público, o efeito da alta dos preços foi potencializado pela ausência de reajustes ou por aumentos tímidos para parte dos servidores, avaliam economistas.
“Em um contexto de inflação alta, o congelamento de salários faz a renda média cair mais”, afirma a economista Vívian Almeida, professora do Ibmec-RJ.
O economista Alysson Portella, pesquisador do Insper, tem opinião semelhante. “Vimos dificuldades para a obtenção de reajustes no setor público, que é muito heterogêneo”, diz.
Os dados do funcionalismo divulgados pelo IBGE refletem a situação dos trabalhadores das diferentes esferas de governo (municipal, estadual e federal). Abrangem, além da administração direta, fundações, autarquias e empresas públicas e de economia mista.
No trimestre até julho de 2019, o grupo era composto por 11,5 milhões de pessoas, conforme o instituto. Em igual período de 2022, alcançou cerca de 12 milhões, uma alta de 4,6%.
“A perda de renda tem impacto do congelamento dos salários de servidores”, afirma o economista José Celso Cardoso Júnior, coordenador da comissão de estudos do Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado). “A inflação rebaixou o poder de compra de todos. Dependendo da categoria, os trabalhadores conseguiram mais ou menos reposição”, acrescenta.
Mesmo com a queda mais intensa, os empregados do setor público ainda apresentam um rendimento mais elevado na média (R$ 4.086) do que os da iniciativa privada (R$ 2.350), conforme o IBGE.
Economistas, porém, sinalizam que o funcionalismo apresenta alto nível de disparidade nas remunerações. Assim, os supersalários da chamada elite do serviço público acabam puxando a renda média para cima. “O grosso da folha de pagamento é preenchido por servidores de áreas como saúde e educação, longe de serem privilegiados”, afirma Almeida, do Ibmec-RJ. De cerca de 11,5 milhões de vínculos de trabalho no funcionalismo público do Brasil, em 2018, um quarto recebia até R$ 1.566, e a metade ganhava até R$ 2.727, indicou nota técnica do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) de agosto de 2021.
Conforme o mesmo estudo, quase 90% do funcionalismo do país recebia valor igual ou menor do que 80% dos servidores do Judiciário federal.
“O setor público tem uma heterogeneidade grande. Vai desde as vagas com supersalários do Judiciário até trabalhadores como o recepcionista de um hospital”, analisa o economista Rodolpho Tobler, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).
Segundo os dados da Pnad Contínua, a renda dos empregados no setor público também caiu mais do que a dos empregadores no setor privado na pandemia.
Os donos de negócios viram o rendimento médio recuar de R$ 6.932 no trimestre até julho de 2019 para R$ 6.459 em igual intervalo de 2022 (-6,8%).
Na Pnad, somente a categoria dos trabalhadores por conta própria teve variação positiva no mesmo período, de 3,5%. A renda média desse grupo, cuja população ocupada bateu recorde durante a pandemia, passou de R$ 2.051 para R$ 2.122.
A pesquisa do IBGE divide o setor público em três fatias: militares e estatutários, empregados com carteira assinada e empregados sem carteira.
O maior grupo é o dos militares e estatutários. O número de ocupados subiu 2,6% entre o trimestre até julho de 2019 e igual intervalo de 2021, para 7,9 milhões. Representa 65,3% do total de empregados no setor público (12 milhões).
Os militares e estatutários têm a maior renda média do funcionalismo, segundo o IBGE. O rendimento, porém, não ficou imune às perdas. Caiu 6,6% ao longo da pandemia, de R$ 5.128 para R$ 4.792. “Há o efeito da inflação e da não recomposição salarial”, diz Tobler.
Em valores relativos, a maior baixa na renda dentro do funcionalismo foi registrada pelos empregados com carteira, que somam 1,3 milhão de pessoas (11% do total).
O rendimento desse grupo caiu 18,2%, de R$ 4.651 no trimestre até julho de 2019 para R$ 3.803 em igual intervalo de 2022. Para economistas, a redução pode estar associada à abertura de vagas com salários mais baixos durante a pandemia, além dos efeitos da inflação. De acordo com o IBGE, os empregados com carteira no setor público normalmente ocupam cargos em comissão. Ou seja, reúnem pessoas nomeadas que, por não serem concursadas, seguem o regime da CLT.