Em um país em que oito a cada dez alunos encontram-se na rede particular de ensino superior e dois a cada dez na rede básica particular, um aumento de tributos pode afetar a todos.
A Reforma Tributária tem tudo para ser a principal pauta do Congresso em 2021, após a definição da presidência das casas. Não há como negar a necessidade de uma reforma que traga maior transparência e justiça ao nosso sistema tributário. Entretanto, uma das grandes questões para que a reforma atinja tais objetivos é perguntarmos: o que queremos para o futuro da educação do país?
Parece um pouco fora do comum dizer que a Reforma Tributária pode impactar o desenvolvimento educacional brasileiro, mas é um fato que tem tido pouca atenção de nossos parlamentares e agentes públicos, para não dizer da população como um todo.
As principais propostas de Reforma Tributária em discussão no Congresso Nacional visam unificar diversos tributos e estabelecer uma alíquota única. Isso levaria a um aumento de tributos para o setor de serviços como um todo mas especialmente para o setor de educação, o que traria consequências graves para o país. Isso porque 75% dos alunos do ensino superior encontram-se na rede privada, aproximadamente 6,4 milhões de alunos. Já a rede básica privada atende 20% do total de alunos, algo próximo a 9 milhões. Ou seja, mais de 15 milhões de alunos poderiam ser afetados.
Em primeiro lugar, vale mencionar que países que utilizam de Imposto Sobre Valor Agregado (IVA) – uma das propostas concorrentes da Reforma e a mais avançada – sabem da importância dos setores de saúde e educação. Tanto que oito em cada dez desses países isentam educação ou dão uma alíquota diferenciada. Já as propostas no Brasil ainda não trouxeram uma alíquota diferenciada para a educação para que não ocorra um aumento de carga tributária. Por isso, entidades do setor da educação favoráveis a uma Reforma Tributária se uniram no movimento Não à Custa da Educação, para tentar trazer dados sobre o setor e possíveis impactos negativos de uma proposta que traga aumento de tributo.
É importante desconstruirmos alguns mitos sobre o ensino particular, como o de que quem usa educação privada no país são os ricos. Quase 90% das famílias que utilizam ensino particular têm renda familiar per capita de até 3,5 salários mínimos, e 51% têm renda familiar per capita de 1,5 salários mínimos. O grande público que utiliza a rede particular são as classes C, D e E. No ensino superior o perfil de alunos são trabalhadores, que estudam à noite, muitas vezes o primeiro da família a se formar e oriundos da educação pública. No ensino básico, a maioria são as famílias de classe média que se esforçam para dar ensino de qualidade para seus filhos.
A pauta de educação no Brasil não pode ser um embate entre setor público e privado. Para grande parte da população não há alternativa para cursar ensino superior que não seja a rede privada. Além do que, todas as pessoas que cursam ensino privado ajudam, por meio do pagamento de impostos, a pagar o estudo de quem cursa o ensino público. Portanto, aumentar os tributos para esse setor seria de uma enorme injustiça: por um lado, impossibilitaria alunos de cursar ensino superior e de buscar melhores condições de vida, e no ensino básico obrigaria uma parcela significativa dos alunos a recorrer ao sistema público, onerando ainda mais a rede pública de educação.
Outra preocupação com as reformas tributárias é o fim do Prouni, programa destinado a conceder bolsas em instituições privadas para alunos de baixa renda, em troca de isenção de alguns tributos proporcional às bolsas concedidas. Com a redução do Fies, o Prouni acaba sendo hoje um dos poucos programas de acesso ao ensino superior. Atualmente, o programa beneficia cerca de 700 mil alunos e, com o teor dos textos dos projetos sobre a Reforma Tributária que estão tramitando no Congresso Nacional, esse programa deixaria de existir.
A Reforma Tributária é importante, mas precisamos de uma reforma que preserve e promova a educação, e precisamos ter consciência do impacto dessa mudança no país que queremos ter e deixar para o futuro. É claro que a reforma tributária sozinha não conseguirá resolver os problemas históricos de educação que existem no país, mas também não pode piorar o cenário atual. Afinal, educação não é custo, mas investimento.
*Juliano Griebeler é mestre em Ciência Política, professor e diretor da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup).
Fonte: Congresso em Foco