Com o título “Escola sem Partido: censura ao saber”, eis o Editorial do O POVO desta quinta-feira. Aborda a volta de tema polemico ao cenário dos debates no Poder Legislativo cearense e puxado pela deputada Dra. Silvana (PR). Confira:
Voltou a tramitar, na Assembleia Legislativa, o controverso projeto de lei Escola sem Partido, surpreendendo a muitos que haviam classificado como iniciativa de bom-senso a sua retirada de pauta, no fim do período legislativo anterior. Seu retorno significa a persistência do equívoco (?) de um segmento político e confessional/religioso de natureza conservadora, aparentemente não sintonizado com a natureza do Estado Democrático de Direito e de seu compromisso fundante com o pluralismo de ideias e de visões de mundo e, sobretudo, com a liberdade de expressão, da qual a liberdade de ensino é um de seus derivativos mais destacados, junto com a laicidade do Estado.
A pretexto de combater suposta “contaminação político-ideológica das escolas brasileiras” e a utilização da “audiência cativa” dos estudantes para adesão a “determinadas ideologias” defendidas por professores (inclusive, com “possibilidade de ‘bullying’” e até agressões físicas aos estudantes que a rejeitarem, além da suposta “usurpação” do direito dos pais de educarem “moralmente” seus filhos), os promotores nacionais do projeto pretendem criar um sistema de censura aos professores capaz de garantir um ensino com “neutralidade política, ideológica e religiosa”.
Ora, além de atropelar princípios constitucionais, sobretudo os relativos aos direitos da Liberdade (no caso, a liberdade de cátedra ou de ensino), a pretensão a uma suposta “neutralidade” de ensino é uma falácia. Até nas ciências exatas isso não se aplica, pois, hoje, está sobejamente comprovado que o observador, independentemente de sua vontade, influencia o objeto observado, a partir da própria manipulação do instrumento utilizado na sua observação. Não existe o professor “neutro”, assim como não existe cientista ou ensino “neutro”. Essa própria concepção de “neutralidade” já é ideológica, pois expressa uma percepção de um segmento da sociedade. Tem lado.
Claro, é inegável que, aqui ou ali, um ou outro professor pode querer impor uma visão única. Mas, isso pode ser perfeitamente corrigido pela dinâmica do espaço escolar, indutor de consciência crítica e inimigo de porteiras fechadas. Nada de garrote para tolher a liberdade básica dos professores de se expressar e abrir o acesso às diferentes formas de pensamento que, ao fim, comporão a formação dos alunos. Como disse alguém: “Só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros”. No ambiente escolar essa inquietude não-conformista deve ser incentivada e não silenciada por um ambiente de censura, policiamento e “deduragem”. Este só gera mediocridade, intolerância e obtusidade. O Brasil não merece mergulhar em tal charco de estupidez.
(Editorial do O POVO | Via Blog do Eliomar)