Em seminário, fazendários debatem o futuro da Sefaz, reforma administrativa e assédio moral

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“Sefaz: presente e futuro” foi o tema do seminário promovido pelo Sindicato dos Fazendários do Ceará (Sintaf) nesta quarta-feira, dia 29 de setembro, alusivo ao dia do servidor fazendário. Ocorrido no auditório da Sefaz, em formato híbrido, o evento discutiu os rumos da Secretaria da Fazenda, os impactos da reforma administrativa e a incidência de assédio moral no serviço público.

Como palestrantes, participaram o deputado estadual Renato Roseno (PSOL-CE), o diretor da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), Celso Malhani, e a Profª Doutora Petilda Vazquez.

Nova realidade para o serviço público

Em sua saudação, o diretor de Organização do Sintaf, Carlos Brasil, evidenciou a importância da categoria fazendária, “que trabalha incansavelmente para obter os recursos necessários para que o Estado possa implementar políticas públicas que visam minorar as injustiças ainda presentes em nossa sociedade”.

Destacando as reformas trabalhista e previdenciária, e a reforma administrativa em curso, Carlos Brasil criticou os impactos negativos da agenda neoliberal para o serviço público. “O que está a se discutir hoje na Câmara Federal não é outra coisa senão o projeto de Estado Mínimo e a precarização do serviço público, que acarretam perdas significativas para as camadas mais sensíveis de nossa população”, afirmou.

“Quem faz a Sefaz são os fazendários”

O primeiro painel, “Sefaz: presente e futuro”, contou com as reflexões do diretor de Comunicação do Sintaf, Nilson Fernandes. Conforme destacou o diretor, o futuro é resultado das ações do presente. “Ainda que o futuro seja intangível, a partir dos atos de hoje podemos projetar o que virá”, disse. O diretor convidou os servidores a uma análise mais profunda sobre a Sefaz do presente. “Como estão as estruturas das unidades fazendárias espalhadas no nosso Estado? Como estão as condições de trabalho? Temos suporte para fazer uma boa fiscalização e desenvolver as atividades fins da Secretaria da Fazenda? Como está o clima organizacional?”, questionou.

Nilson enfatizou que, para desempenhar um bom trabalho, os servidores precisam ser ouvidos e valorizados. “Quem faz a Sefaz são os fazendários. Se o governo teve condições de enfrentar a pandemia, parte disso deve-se ao trabalho dos servidores”, asseverou.

“O futuro que nós queremos é melhor”

Primeiro a discorrer sobre a PEC 32/2020, o deputado estadual Renato Roseno (Psol) buscou contextualizar as diversas crises que tentam justificar o desmonte do serviço público. “É preciso vencer esse pensamento de que não haveria alternativas à restrição de direitos, à restrição da democracia”, destacou.

De acordo com o deputado, a Constituição de 1988 se consagrou como um pacto sócio-político onde a nossa sociedade queria mais participação popular e mais investimento social. “A reforma administrativa é mais uma tentativa de desmonte desse pacto sócio-político. Ela se institui dentro de uma agenda de reformas que começou com a trabalhista – um grande engodo, que ampliou a precarização e escravização dos trabalhadores – e teve continuidade com a reforma previdenciária. Agora, a reforma administrativa busca abrir caminho para o processo apropriação, pelo capital, da riqueza socialmente produzida. E tudo em nome da modernização. Mas o pior do moderno é a precarização, é a ultra-exploração do trabalhador”, advertiu.

O deputado apresentou, em síntese, os principais prejuízos com a aprovação da PEC 32: contratos menos estáveis; patamares remuneratórios mais reduzidos; flexibilização da estabilidade dos servidores; fragilização do concurso público; instrumentos de cooperação que, na prática, abrem possibilidade para a privatização de serviços públicos; e a concessão de superpoderes presidenciais. “O resultado será postos de trabalho menos estáveis e menores patamares salariais. O objetivo é gastar menos com o serviço público e aumentar o poder despótico dos chefes de executivo”, criticou.

Por outro lado, no exercício financeiro de 2020, o Governo Federal gastou R$ 1,38 trilhão com o serviço da dívida pública, de um total de despesa de R$ 3,72 trilhões, correspondendo a 37% das despesas da União. “É um Estado que arrecada muito do mais pobre para bancar o mais rico, por via de um sistema tributário regressivo, benevolente com o andar de cima”, salientou Renato Roseno. “Por essa razão temos a crise do financiamento das políticas públicas, pois metade das riquezas do país foi arrancada pelo rentismo”.

Segundo o deputado, a crise do subfinanciamento do setor público gera crise da capacidade de entrega dos serviços públicos que, por sua vez, gera uma crise de legitimidade quanto à importância das políticas sociais. “Colocam a sociedade contra os servidores públicos. O poder nos quer amedrontados, deprimidos. Mas a batalha da legitimidade só será ganha por nós quando conseguimos mostrar à sociedade brasileira que o futuro que nós queremos é melhor. O futuro que eles estão desenhando é um futuro absolutamente dominado pelo mercado, sem direitos, sem política pública, com brutal concentração de riquezas. Mas nós poderemos reescrever o nosso futuro. E isso se faz na política. É nesse ambiente em que se disputam as expectativas”, concluiu o deputado Renato Roseno.

“PEC 32 não é reforma, é desmonte”

Em sua palestra, o diretor da Fenafisco, Celso Malhani, fez questão de enfatizar que a PEC 32 não é reforma, é desmonte dos serviços públicos. “A verdade sobre a PEC 32 é que ela não reforma, mas destrói, desmonta e abre caminho para a privatização dos serviços públicos. Quem mais perde com isso é o povo, em especial os mais pobres”, declarou.

Segundo Malhani, a proposta permite e prega a terceirização generalizada da prestação do serviço público. “Através de convênios, será possível delegar serviços públicos à iniciativa privada, inclusive com utilização compartilhada de recursos humanos e materiais, como prédios públicos. O texto aponta até mesmo para escolas e hospitais. Esse é o grande foco da PEC 32: entregar o serviço público para a iniciativa privada”, salientou.

O diretor da Fenafisco ressaltou, ainda, que a terceirização é um caminho de contratação de apadrinhados. “No texto da PEC, foi retirado o fim da estabilidade como estava previsto, mas foi mantida a possibilidade da contratação temporária por até dez anos. E não está vedada a possibilidade de que uma lei prorrogue tal contratação por mais dez anos. Se permitimos essa possibilidade de contratações temporárias de longa data, nós acabamos com a estabilidade”, advertiu.

Nem mesmo as carreiras típicas de Estado estão livres dos prejuízos da PEC. “Ainda que o ingresso para as carreiras de Estado sejam via concurso público, no último texto não foi vedada a contratação temporária para estas carreiras”, alertou Celso Malhani. “Dessa forma, as carreiras de Estado, que têm a função finalística de representação da atividade estatal, poderão ter servidores temporários atuando. As demais carreiras poderão ser integralmente compostas por trabalhadores temporários e terceirizados. Se você pode contratar sem concurso, o que vai sobrar de servidor público estável? Muito pouco. Além disso, o trabalhador fica obrigado a colaborar com quem lhe deu emprego, submetendo-se ao assédio moral. Não há regras de demissão ou proteção para esses trabalhadores”, completou.

A PEC 32 também prevê a redução de jornada com diminuição de salários. “E neste ponto as carreiras de Estado também poderão ter seus vencimentos reduzidos, especialmente se os limites da lei de responsabilidade fiscal forem atingidos”, assegurou. Os servidores estarão submetidos, ainda, a processos de avaliação de desempenho, que em nenhum momento visam a qualificação da oferta do serviço e a melhoria da gestão. A reforma administrativa permite, ainda, a demissão de servidores estáveis por razões diversas.

De acordo com Celso Malhani, há um grande trabalho de articulação e mobilização para que a PEC 32 não seja aprovada. “A Fenafisco trabalha em conjunto com o Fórum Nacional de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), que congrega outras 36 entidades nacionais. Nós estamos focados no processo de derrubar a PEC, mas também preparamos eventuais caminhos de redução de danos. Atuamos nas audiências públicas e conseguimos reverter alguns prejuízos de forma razoável, até a 5ª versão do texto da PEC. Mas precisamos da mobilização de todos os servidores públicos, nas ruas e nas redes sociais, cobrando todos os dias que os deputados votem contra a reforma administrativa. Isso vai fazer a diferença”, salientou.

Assédio moral no serviço público

Em sua fala, a professora e pesquisadora Petilda Vazquez traçou um breve histórico sobre as relações de poder na sociedade brasileira para explicar as lógicas corporativas que resultam na prática do assédio moral. Em sua análise, Petilda explanou sobre a competitividade do mercado de trabalho, as cobranças por desempenho e as consequências psíquicas que esses aspectos causam no trabalhador.

“A lei escrita é carregada da tradição de 400 anos de direito como obediência e coerção. A experiência de sofrimento invisível só o sujeito pode dizer, na sua vivência. Nós estamos falando de algo que é invisível e que é subjetivo; esse é o desafio que nós temos, na decodificação do que é a violência moral”, pontuou a socióloga.

Para a pesquisadora, o sistema organizacional e a lógica do capitalismo favorecem os danos morais: “A própria polivalência, que é a ideia de que o trabalhador pode e deve somar muitas funções e atribuições, é banalizada. Mesmo sendo assediado, o trabalhador acha que é normal tudo isso, e só vai perceber quando o problema compromete sua integridade física, emocional e psíquica”, salientou Petilda.

“Os trabalhadores seguem uma lógica perversa do capitalismo, a pressão das empresas por metas, produtividades e resultados acarreta em ameaças, assédio moral, e medos que levam ao adoecimento do empregado, quando, na verdade, o trabalhador deveria gozar do prazer na realização de suas atividades”, defendeu a pesquisadora.

▪ Confira o seminário, na íntegra, no canal do Sintaf no YouTube.

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