Desemprego crescente e menor valor do auxílio emergencial agravam desigualdade social em 2021

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Dependência de programas de transferência de renda é fator de preocupação, segundo especialistas

Com a redução do valor e do número de pessoas beneficiadas com o auxílio emergencial, além da maior deterioração da economia, os indicadores sociais e de renda devem piorar neste ano.

A previsão parte do contínuo aumento da taxa de desemprego ao longo de 2021, combinado com a redução dos programas de transferência de renda e a disparada da inflação, arranjo que resulta em mais desigualdade e pobreza no Ceará.

O coordenador do Laboratório de Estudos da Pobreza (LEP) da Universidade Federal do Ceará (UFC), Vitor Hugo Miro, lembra que o auxílio emergencial foi bem-sucedido em amortecer os impactos da atividade econômica durante a pandemia, especialmente nos primeiros meses.

O esforço se traduziu em aumento do rendimento médio mensal do cearense oriundo de todas as fontes no ano passado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Com a redução do programa e uma nova onda de contaminação esse ano, que exigiu medidas restritivas tão duras quanto as adotadas em 2020, a perspectiva é que essa pequena melhora retroceda.
“Com certeza, os resultados para 2021 vão sofrer impacto da redução do benefício, importante impacto que deve se traduzir em aumento de pobreza e desigualdade”, afirma.

Ele acrescenta que os indicadores já apontam uma deterioração do mercado de trabalho em relação a 2020.

FAMÍLIAS JÁ RELATAM DIFICULDADES
A diarista Gabriela de Farias conseguia serviço para a semana inteira antes da pandemia e recebia um complemento do Bolsa Família.

Com a chegada da crise sanitária, ela precisou parar de trabalhar, mas o auxílio de R$ 1,2 mil deixou o orçamento da família com um pouco mais de folga.

Com a redução do benefício neste ano e com apenas duas clientes, a chefe da família, que cuida da filha sozinha, revela que as contas apertaram novamente.

“Ficou mais complicado, porque a gente tinha um valor maior e tudo está um absurdo. Mas não passamos fome ainda, graças a Deus”
GABRIELA DE FARIAS
Doméstica
Ela detalha que está mais difícil conseguir clientes para as faxinas até mesmo por conta do homeoffice.

“Muito gente ficou em casa e prefere fazer (as atividades domésticas) do que pagar alguém”, pontua.

Gabriela ainda não recebeu o primeiro pagamento do Auxílio Brasil, programa de transferência de renda que substituiu o Bolsa Família a partir deste mês de novembro.

No entanto, o aplicativo indica que ela deve receber cerca de R$ 149, menos da metade dos R$ 375 que vinha recebendo do auxílio emergencial neste ano.

Ainda assim, o valor é cerca de R$ 20 a mais do que o Bolsa Família antes da pandemia.

CEARÁ É O 2º MAIS DESIGUAL DO BRASIL
Conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Ampla (Pnad Contínua), pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a desigualdade no Ceará teve uma leve queda na passagem de 2019 para 2020.

O resultado é indicado pelo índice de Gini da renda domiciliar per capita, ou seja, a concentração de dinheiro das famílias proveniente de todas as fontes, incluindo trabalho e programas sociais.

O indicador varia de 0 a 1: quanto mais perto de 1 mais desigual; quanto mais perto de 0, mais próximo do cenário ideal.

Em 2019, o índice de Gini do Estado era 0,562, valor que caiu para 0,544. Ainda assim, o número é o segundo maior do País, atrás somente do Distrito Federal (0,548) e do Rio de Janeiro (0,548), empatados na primeira colocação.

A média nacional do indicador ficou em 0,524, indicando também uma melhora em relação ao ano anterior (0,544). Com índice de 0,412, Santa Catarina foi o estado com a menor desigualdade em 2020.

CONFIRA A LISTA DOS FEDERADOS MAIS DESIGUAIS DO BRASIL:
Rio de Janeiro 0,548
Distrito Federal 0,548
Ceará 0,544
Roraima 0,540
Bahia 0,537
Pernambuco 0,536
Amazonas 0,533
Sergipe 0,524
São Paulo 0,522
Acre 0,515
O analista de disseminação das pesquisas do IBGE Ceará, Helder Rocha, aponta um outro dado que demostra a concentração de renda no Estado.

Segundo ele, o 1% da população mais rica do Ceará concentra 40,5% a mais de recursos que a metade mais pobre.

Rocha indica que a desigualdade mostrada pelo Índice de Gini vinha melhorando até 2014, quando chegou ao menor patamar dos últimos nove anos, mas voltou à tendência de alta até atingir o maior patamar da série em 2019.

DEPENDÊNCIA DE PROGRAMAS SOCIAIS
O levantamento ainda demonstra que 32,3% dos domicílios cearenses foram beneficiadas com o auxílio emergencial, por exemplo. Outras 13,2% famílias continuaram recebendo o Bolsa Família em 2020.

“O Norte e Nordeste tiveram os maiores percentuais de domicílios atendidos pelos programas do Governo. Foi devido ao auxílio que o rendimento domiciliar per capita não teve uma queda maior”, explica.

Ele ainda aponta que, sem o benefício, a desigualdade teria se agravado mais ainda.

O coordenador do LEP, Vitor Hugo Miro aponta que essa dependência de programas sociais é um fator preocupante, já que há uma redução da participação do rendimento do trabalho.

“Isso mostra um cenário econômico não tão aquecido, uma geração de empregos comprometida. A melhor forma de sair desse cenário de recessão é gerando emprego, aumentando renda do trabalho, a participação da renda do trabalho”, alerta.

Fonte: Diário do Nordeste

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