Conter alta das desigualdades vira desafio global no pós-pandemia

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Legenda: Indianos protestam contra o Governo por falta de alimentos em Amritsar, noroeste do país
Foto: AFP

“As epidemias tendem a derrubar ainda mais o que já está em declínio. Elas são de alguma forma um acelerador e revelador de fraquezas”, disse o economista Pierre Dockes, professor emérito da Universidade de Lyon 2, durante um simpósio realizado no fim de semana, em Paris.

Desde o início da pandemia, médicos e epidemiologistas descobriram que o novo coronavírus afeta mais gravemente pessoas com doenças crônicas (obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares), proporcionalmente mais presentes na população pobre.

E, acima de tudo, as pessoas com empregos de pouca qualificação tiveram que continuar trabalhando para manter os setores de alimentos, o comércio eletrônico ou serviços de saúde. “Todas essas pessoas que continuaram trabalhando, apesar dos riscos, são pessoas de classe baixa”, disse Mark Stabile, pesquisador da escola de negócios Insead, especialista em desigualdades.

Nos países desenvolvidos, as políticas de austeridade após a crise de 2008 “reduziram a qualidade dos serviços públicos, no setor da saúde, por exemplo, e o apoio às pessoas necessitadas, sem emprego”, tornando-as mais vulneráveis atualmente, especificou. “Está claro que haverá um aumento das desigualdades devido a esta crise”, alertou a presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde.

O vencedor do Prêmio Nobel da Paz do Egito, Mohamed el Baradei, lembrou “o número de pessoas pobres que morrem simplesmente porque não têm acesso ao sistema de saúde, porque não conseguem manter distanciamento físico, porque os lugares onde moram são muito populosos e porque precisam voltar ao trabalho para sobreviver”, sobretudo em países emergentes.

Para o economista Pierre Dockes, países como Índia ou Brasil podem observar uma desaceleração no avanço dos padrões de vida de suas classes médias em relação aos dos países ocidentais.

Jovens

Outra desigualdade após a Covid-19 se abriu entre gerações, estima a economista italiana Elsa Fornero.

“Enquanto as gerações mais velhas pagam o preço mais alto em termos de vidas humanas, as consequências econômicas, medidas de confinamento – por exemplo, com o fechamento de escolas – deixaram crianças e adolescentes fora do sistema educacional que podem ter consequências a longo prazo”, afirmou.

Estudos realizados após a crise de 2008 mostraram que as gerações que tiveram dificuldades para entrar no mercado de trabalho durante a crise nunca recuperaram o atraso em termos de carreira.

Soluções

Para os especialistas, além do renascimento econômico para impulsionar o crescimento, é necessário criar soluções para conter essas desigualdades.

Alguns economistas, como Gabriel Zucman, defendem um sistema tributário para os mais ricos, baseado no modelo da experiência alemã após 1945. A Alemanha “optou por impor retenções temporárias e progressivas a grandes fortunas”, ao contrário da França e do Reino Unido, que preferiam deixar a inflação correr para reduzir a dívida, citou.

A italiana Elsa Fornero estimou que o enorme endividamento dos Estados para apoiar a recuperação econômica poderia criar outro fardo para as gerações jovens e, portanto, também deveria “proporcionar investimentos em capital humano”. Os investimentos para combater as mudanças climáticas devem ser direcionados aos mais desfavorecidos, porque “é sempre o mais frágil que tem dificuldades para suportar o impacto”, diz Kevin Sneadre, da consultoria McKinsey.

Para a diretora do ING Bank France, Karien Van Gennip, é preciso olhar além do aspecto econômico e “renovar o contrato social”. “É a coisa certa a fazer em tempos de crise”.

Já o papel do Estado como protetor e estrategista ganhou importância com a crise do coronavírus, que pode permitir que a União Europeia adquira poderes de um Estado federal, segundo especialistas.

“Gastos públicos e a questão da eficácia do Estado como Estado soberano, Estado de bem-estar social e estrategista, são a questão central para os próximos anos”, diz o economista Christian Saint-Étienne. “Todos os cidadãos do mundo perceberam que nossos sistemas de saúde são absolutamente essenciais”, explicou a ministra espanhola da Economia, Nadia Calviño.

Diário do Nordeste
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