Ceará acumula 5 anos de perdas nas relações comerciais com outros estados

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Baixo potencial das indústrias e da agricultura são apontados como motivo do déficit persistir, segundo analista. Ao todo, foram R$ 197,64 bilhões

O desafio de tornar as relações comerciais superavitárias não existe apenas em relação aos negócios entre o Estado e o Exterior. Na balança comercial interestadual, o Ceará contabiliza um déficit de R$ 197,64 bilhões em cinco anos de relações comerciais com outros estados brasileiros, segundo atesta os números compilados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).

Das relações com os demais 26 estados brasileiros ao longo desse período, o Ceará consegue ganho apenas sobre Acre (R$ 298,38 milhões), Amapá (R$ 1,17 bilhão), Maranhão (R$ 6,66 bilhões), Mato Grosso (R$ 717,14 milhões), Piauí (R$ 7,98 bilhões), Rio Grande do Norte (R$ 10,32 bilhões), Roraima (R$ 1,01 bilhão) e Sergipe (R$ 895,29 milhões). Com todos os demais registrando perdas.

O boletim Balança Comercial Interestadual do Consefaz contabiliza as notas fiscais trocadas entre os entes federados, mas não aponta quais os segmentos que geraram esses documentos. Os dados começaram a ser divulgados apenas em 2017, “regimento interno aprovado pelo Convênio ICMS 133/97, que estabelece a disponibilidade destas informações para público em geral.”

Desde esta data, os resultados cearenses são negativos. Foram perdas sucessivas de R$ 29 bilhões (2017), R$ 36 bilhões (2018), R$ 36 bilhões (2019), R$ 43 bilhões (2020) e R$ 53 bilhões (2021).

Setores produtivos de baixo potencial

“Explicação do nosso déficit é clara: dependência tecnológica. Um estado superavitário ou tem tecnologia na manufatura ou na agricultura, que consegue ser grande produtor”, afirma Alexsandre Lira Cavalcante, analista de Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece).

A compra da maioria dos itens manufaturados, seja de grandes máquinas até itens de uso pessoal, assim como de alimentos de outras unidades da federação atestam a dependência da economia do Ceará, de acordo com ele.

Cavalcante ainda compara a balança interestadual com a de comércio exterior, onde apenas as chapas de aço da Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP) representam quase metade da pauta exportadora do Estado.

O economista cita ainda o papel de estados como São Paulo e Paraná na economia brasileira. Respectivamente, os dois são produtores da maior parte dos artigos manufaturados e da agricultura do País e figuram como na liderança e vice dos sete estados superavitários do País em 2021.

Enquanto São Paulo acumulou um superávit de R$ 253 bilhões, o Paraná conseguiu R$ 40 bilhões. Numa lista que inclui ainda Santa Catarina (R$ 182 bilhões), Rio Grande do Sul (R$ 2 bilhões), Mato Grosso do Sul (R$ 19 bilhões), Espírito Santo (R$ 30 bilhões) e Amazonas (R$ 146 bilhões).

“Nós temos a nossa economia mais tradicional e com vocação maior para o setor de serviços e comércio, com turismo. Essas trocas com outros estados não são tão intensas, como estados como São Paulo, onde tem a economia que tem indústria, que representa forte parte da construção do PIB do estado, e permite maior fluxo de comercialização para outros estados”, acrescenta Davi Azim, economista do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE).

Origem histórica

A formação da economia cearense, de baixa produtividade agrícola e pouca industrialização, é mais uma explicação para que as relações comerciais com os demais entes federados gerem perdas. Com vocação econômica construída para a prestação de serviços e o comércio, o Estado não consegue virar o resultado da balança.

“Se a gente fosse exportar serviço? Não sei, é muito forte internamente. Temos uma economia de serviços, saúde, turismo… Mas quando fala de indústria, a indústria está perdendo peso dentro do PIB do Estado”, aponta Cavalcante.

Sobre a chegada de Centros de Distribuição de grandes empresas ao Ceará, como Amazon e Americanas, Azim afirma que “esses players podem sim ajudar nessa questão do fluxo comercial.” Mas Cavalcante alerta para a função desses equipamentos: “se forem meros distribuidores e a nota fiscal for gerada lá no Sul ou Sudeste, não trará efeito nenhum para a balança comercial interestadual.”

Estratégias fiscais reforçam o caixa do Estado

Alvo de toda reforma tributária em debate no País, o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é o responsável por gerar as notas fiscais compiladas pelo Confaz e que atestam o déficit cearense na balança comercial interestadual. Mas nenhuma das medidas pensadas nas reformas ou mesmo as adotadas no âmbito cearense podem reverter as perdas nas relações com demais entes federados.

Uma das últimas alterações, o retorno da cobrança do Diferencial de Alíquotas (Difal) no dia 1º de abril é encarado pelos economistas como uma forma de fortalecer o caixa do Estado, mas não de reverter a posição do Ceará ante os demais.

“Esta alíquota entre os estados vai gerar muito embate. Em relação à cobrança, a depender de cada produto, como somos muito dependentes industrializados e agrícolas, não é favorável para nós. Mas acredito que, em relação às contas públicas, vai ser positivo. Vai ter um recurso interessante para o fluxo de caixa e receitas correntes do Estado, mas com relação à balança, não, devemos ter ampliação do déficit”, aponta Davi Azim, do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE).

Para a contadora Rosita Delavor, os artifícios usados pelo fisco têm como principal preocupação justamente o apontado pelo economista: o reforço do caixa. Sobre a interpretação das empresas sobre a volta do Difal, ela conta que, dos clientes de seu escritório, todos devem repassar eventuais custos ao consumidor final.

“Temos muito o que avançar nessa questão, como atrair novos negócios, novas empresa, indústria, que adicionem valor, gerem emprego e, apesar de a economia mundial ser de serviço, não podemos nos desligar da produção industrial e agrícola”, arremata Alexsandre Lira Cavalcante, analista de Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa e Estratégica Econômica do Ceará (Ipece).

Fonte: O POVO

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