Desde a implementação do Plano Real, em 1994, o Governo Federal tem efetivado uma política deliberada de valorização do salário mínimo. Em 2011 e 2015, foram aprovadas duas leis que institucionalizavam esta política, estabelecendo uma regra fixa de reajuste do salário. A lei 13.152/2015 perdeu a validade em 2019 e o governo Bolsonaro decidiu não apresentar nova lei nesse sentido. Dessa forma, Bolsonaro é o primeiro, desde 1994, que não adotou uma política de valorização do mínimo. Limitou-se a repor a inflação oficial medida pelo IPCA.
Como tudo em economia, isso traz consequências positivas e negativas para a sociedade. A falta de uma política de valorização gera um impacto positivo sobre a planilha de custo das empresas. É um alívio, uma vez que os encargos trabalhistas giram em torno de 58% do valor bruto do salário no Brasil enquanto a média global é de 22,5%. Outro impacto positivo é sobre o orçamento público, pois o salário mínimo serve de piso para o pagamento de pensões, aposentadorias e benefícios assistenciais. É, portanto, um alívio para a Previdência que terá uma desaceleração do aumento do déficit.
Mas a consequência nefasta da não-adoção dessa política recai sobre os mais pobres. O impacto do salário mínimo na redução da proporção de pobres varia entre 5% e 13%, sendo o impacto maior devido à renda de benefícios e aposentadorias. Há estudos, realizados em 2017, que apontam ser o salário mínimo responsável por explicar até 40% da redução de domicílios pobres no País.
A escolha do IPCA como índice para repor perdas salariais também prejudica os mais pobres, uma vez que este índice abrange famílias que recebem até 40 salários. O INPC seria o índice mais realista, pois abrange famílias que recebem até cinco salários. Por esta conta, o salário mínimo deveria ser de R$ 1.101,95 para somente repor a inflação no período.
O que poderia trazer uma compensação para esta situação seria uma política de renda mínima focalizada nos invisíveis e vulneráveis. O Bolsa Família já se mostrou eficiente, mas é preciso decisão política. E essa, está em falta no mercado atual.
* Alesandra Benevides é professora de Economia da UFC e diretora do Laboratório de Análise de Dados e Economia da Educação (EducLAB)
Fonte: O Povo