76% acreditam que servidor chega à chefia por indicação política, diz Datafolha

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Maioria defende avaliação de lideranças do setor público, aponta pesquisa encomendada pelo Movimento Pessoas à Frente

Para 76% dos brasileiros, todos ou a maioria dos cargos de chefia nos órgãos públicos são ocupados por indicação política. Para 79%, a minoria ou nenhum deles trabalha muito para resolver os problemas da população.

É o que mostra pesquisa Datafolha encomendada pelo Movimento Pessoas à Frente, que reúne representantes dos setores público e privado e é financiado por três organizações do terceiro setor: Instituto República.org, Fundação Lemann e Instituto Humanize.

Na pesquisa, foram ouvidas 2.072 pessoas, de 9 a 20 de julho. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

Segundo o Datafolha, 84% dos brasileiros veem a avaliação regular de lideranças do setor público como muito importante.

O levantamento também mostra que 88% colocam a experiência na área de atuação como um dos três requisitos mais importantes para escolha de quem ocupará esses cargos de chefia. O processo seletivo baseado em competências foi citado por 79% dos entrevistados —cada pessoa poderia escolher três opções. “Ter valores morais em que eu acredite” aparece em terceiro lugar, com 72%.

Weber Sutti, diretor da Fundação Lemann e integrante do Movimento Pessoas à Frente, afirma não ser contra indicações políticas, mas cita exemplos de países que adotam processos de seleção abertos a toda a população e que resultam em listas fechadas para seleção por parte dos políticos.

Chile, Reino Unido e Cingapura, por exemplo, adotam modelos em que há informações públicas sobre todos os cargos de liderança no governo, quais as competências necessárias para ocupá-lo e as metas de resultado.

Para ele, a indicação meramente política é ruim quando não leva em conta as competências necessárias para ocupar aquela posição, independentemente de a pessoa ser de dentro ou de fora do serviço público.

“O que a gente é contra, porque não tem dado bons resultados no Brasil, é a arbitrariedade. No Brasil, se você quiser saber quem são as 22 mil pessoas nomeadas em cargos de confiança, você não sabe. Não há um portal onde tem quais são as vagas, o que elas deveriam fazer, quais os resultados que deveriam entregar para a população e quem são essas 22 mil pessoas.”

Processos seletivos e avaliação de desempenho de chefias no setor público são práticas adotadas em diversos países. Também estão presentes em alguns estados e municípios no Brasil, como Minas, Rio Grande do Sul, Sergipe e Ceará, mas ainda não são políticas disseminadas e consolidadas no país.

Sutti afirma que a avaliação de desempenho é um processo que precisa ser implantado de cima para baixo. Ou seja, começando pelos resultados daqueles que estão no comando e que, muitas vezes, não possuem as capacidades para exercer aquela função.

A pesquisa mostra, por exemplo, que 67% da população avalia que todos ou a maioria dos servidores enfrentam problemas com chefes despreparados. Para 55%, a minoria ou nenhum servidor é avaliado com base no que entrega para a sociedade.

“A gente sempre tentou fazer avaliação de desempenho. Alguns governos fazem, mas sempre começando pela base da pirâmide. A experiência internacional demonstra que é um equívoco”, afirma Sutti.

“Se você quer gerar resultado para a população, deveria cobrar mais da parte de cima da pirâmide. Se a liderança não é cobrada, há uma grande desmotivação do servidor que é cobrado.”

Joice Toyota, diretora executiva da organização Vetor Brasil e integrante do Movimento Pessoas à Frente, afirma que os resultados da pesquisa desmontam a tese de que a população não compreende a importância dessas pautas para a melhora do serviço público.

“É meio básico ter seleção profissional para cargos de liderança no governo. Foi legal olhar os números e ver que a população também acha isso importante. E isso pode ajudar a empurrar pautas no Executivo e também no Legislativo, para mudar a forma como a gente gerencia o setor público”, afirma a diretora.

Ao lembrar que o Movimento reúne também representantes de servidores, Joice afirma que não dá para avançar nas discussões sobre o tema sem o apoio e a experiência de quem presta serviços à população.

O Movimento apresentou propostas, durante a tramitação da MP 1.042/2021, que tratava da gestão de cargos em comissão e de funções de confiança no Executivo Federal e foi transformada na Lei 14.204.

O processo de seleção baseada em competências não seria obrigatório, mas a autoridade teria de explicar a decisão de não fazê-lo e publicar o currículo do escolhido.

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetou a realização de processo de pré-seleção de candidatos para algumas dessas vagas, com a justificativa de que esse trecho da lei invadiria a competência do Executivo para tratar da questão.

Weber Sutti também defende a regulamentação da Emenda Constitucional de 1998 que trata da possibilidade de demissão de servidores com base na avaliação de desempenho. Diz também que a proposta de reforma administrativa do governo que está no Congresso não resolve os problemas cruciais para melhorar os serviços à população.

“Estamos discutindo coisas que não mudam a realidade do serviço público. O foco deveria estar na regulamentação estrutural e completa da gestão de desempenho e desenvolvimento de uma política de lideranças. Isso mudaria a realidade do serviço público.”

Fonte: Folha de S. Paulo

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